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Atividade física em tempos de pandemia COVID-19

Alex Florindo

Alex Antonio Florindo

Professor Associado da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo e Líder do Grupo de Estudos e Pesquisas Epidemiológicas em Atividade Física e Saúde da Universidade de São Paulo

A pandemia de COVID-19 é o maior problema de saúde pública do século XXI, que causará diversos problemas sociais como aumento da pobreza e desigualdades sociais.  A partir da decretação da pandemia e da recomendação da Organização Mundial da Saúde para que os países adotassem medidas de restrição de circulação e de distanciamento social comunitário para o controle da disseminação da doença na população, nós temos observado mudanças bruscas em alguns comportamentos e um dos que mais tem mudado é a prática de atividade física.

Dados agregados da empresa Fitbit® mostraram que  houve um grande decréscimo no número de passadas registradas por pessoas que utilizam estes aparelhos em diversos países do mundo na semana até o dia 22 de março de 2020 comparadas com períodos similares de 2019. Em países europeus, o decréscimo variou entre 7% a 38% e nos Estados Unidos foi de 12%.  Estes dados indicam que as pessoas praticaram menos atividades ao ar livre como caminhadas e corridas  no período da pandemia.

No Brasil, pesquisa do Instituto Datafolha realizada por telefone entre os dias 18 a 20 de março com amostra 1.558 adultos das regiões Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e Centro-Oeste mostrou que 76% das pessoas  interromperam suas atividades de lazer  após   decretação  das medidas de distanciamento social comunitário e restrição da circulação feita pelos governadores  brasileiros.  Dados de mobilidade da empresa Google®  do dia 17 de abril mostraram que no Brasil houve decréscimo de 50% na ida de pessoas a áreas de lazer como locais para passear com cachorros, praias, praças e parques nas comparações entre 06 de março e 17 de abril. Dados recentes divulgados no Boletim epidemiológico do Ministério da Saúde mostraram resultados preliminares de inquérito feito com telefone para verificar padrões de comportamento de risco para prevenção da COVID-19. Um dos resultados mostrou que 91% dos entrevistados evitaram sair de casa no período da pandemia. Para finalizar, eu realizei uma pesquisa no site da Companhia de Engenharia de Trafego da cidade de São Paulo para verificar a quantidade de ciclistas antes e após a decretação da quarentena. A pesquisa foi feita com base nos contadores instalados na Avenida Brigadeiro Faria Lima, na Rua Vergueiro e na Avenida Gastão Vidigal. Na semana entre 9 a 13 de março foram registados 53.519 ciclistas com média diária de 3.567 ciclistas. Já na semana de 13 a 17 de abril, quando as medidas já estavam em vigor, o total de registro de ciclistas caiu para 25.683 com média diária de 1.712 ciclistas, ou seja, uma redução drástica na quantidade de pessoas usando bicicletas no município de São Paulo.

Estes dados mostram que as pessoas estão praticando menos atividades físicas fora das suas residências, como era de se esperar, pelas importantes medidas recomendadas pelo Ministério da Saúde e adotadas pelos Estados para conter a transmissão abrupta e em massa do novo coronavírus e causar um colapso nos sistemas de saúde. Porém, se as pessoas estão muito tempo dentro das suas residências, emerge outra preocupação importante que é quantidade de comportamento sedentário acumulado, ou seja, quanto tempo elas estão permanecendo sentadas em frente à televisão ou mesmo em outros tipos de comportamento sedentário como sentadas jogando videogame, ou usando computadores ou telefones celulares. Além disso, realmente ainda não sabemos se as pessoas estão praticando exercícios físicos dentro das suas casas.

Sabemos dos benefícios da prática da atividade física para a saúde pública na prevenção de diversas doenças, incluindo as que elevam os fatores de risco para mortalidade por COVID-19, como hipertensão arterial, diabetes tipo 2 e também obesidade, além dos benefícios para a saúde mental, melhora do bem-estar e prevenção de transtornos de ansiedade e depressão. Além disso, sabemos também que maior tempo de comportamento sedentário, principalmente tempo sentado em frente à televisão eleva os riscos de mortalidade. Portanto, neste período de pandemia, tão importante quanto manter o distanciamento social para evitar a propagação do novo coronavírus e da COVID-19 é a manutenção da atividade física e diminuição do comportamento sedentário. É importante que toda a sociedade se mobilize na defesa de comportamentos saudáveis durante a quarentena. Pensando na manutenção de comportamentos saudáveis entre crianças, adolescentes e famílias na época da pandemia, um grupo de pesquisadores do qual eu fiz parte estabeleceu alguns pontos importantes em comentário recente publicado na revista The Lancet Child & Adolescent Health, dentre os quais eu destaco alguns pontos importantes para o Brasil:

Pais e responsáveis nas famílias

É importante interromper longos períodos de tempo sentado, de preferência a cada 30 a 60 minutos, com atividades simples como ficar em pé e se alongar por um minuto; é importante usar mídias eletrônicas para facilitar a participação na atividade física, aproveitando que muitos profissionais de educação física estão oferecendo aulas online gratuitas; é importante enfatizar a participação da família em atividades físicas recreativas em grupos (pais e filhos); é importante manter os horários de dormir e de acordar consistentes, manter televisões desligadas ou telefones celulares fora do quarto onde crianças e adolescentes dormem e evitar assistir televisão ou utilizar celulares antes de dormir.

Professores e educadores

É importante que estes profissionais aproveitem esta oportunidade para incorporar práticas saudáveis de movimento nas rotinas e lições diárias da escola para serem praticadas nas residências; é importante a programação de aulas online de maneira a limitar a permanência prolongada e incentivar mudanças na postura, como ficar em pé regularmente, alongar-se ou mover-se.

Governantes

Devem organizar ações para a promoção de comportamentos saudáveis de movimento em crianças como parte das estratégias de resposta e mensagens públicas; devem envolver pessoas influentes para promover mensagens sobre a importância de comportamentos saudáveis de movimento durante períodos de confinamento.

Meios de comunicação

Principalmente a televisão, que é o meio de comunicação mais assistido, deve fornecer mensagens durante o dia (regularmente) para aumentar a atividade física de pais e filhos e interromper longos períodos de tempo sedentário. Por exemplo, organizar jogos, atividades, brincadeiras com animais de estimação.Temos um grande desafio pela frente que é superar esta pandemia e nos mantermos em distanciamento social, mas também temos o desafio de como nos mantermos ativos fisicamente, seja sozinho ou com nossos familiares em nossas residências. Estes pontos abordados no comentário podem auxiliar nisso.

Para finalizar, gostaria de compartilhar uma experiência pessoal minha referente a este período de quarentena que provavelmente será a de muitos que gostam de praticar atividades físicas ao ar livre. Estou dando muito mais valor aos espaços públicos abertos como os parques aqui em São Paulo. Estou sentindo muito como faz falta os parques abertos para caminhar ou correr. Acredito que após a pandemia daremos mais valor à prática de atividade física em espaços públicos abertos.

Referências consultadas

Ekelund U, Steene-Johannessen J, Brown WJ, Fagerland MW, Owen N, Powell KE, Bauman A, Lee IM. Does physical activity attenuate, or even eliminate, the detrimental association of sitting time with mortality? A harmonised meta-analysis of data from more than 1 million men and women. Lancet. 2016 Sep 24;388(10051):1302-10.

Guan H, Okely AD, Aguilar-Farias N, Cruz BDP, Draper CE, Hamdouchi AE, Florindo AA, Jáuregui A, Katzmarzyk PT, Kontseveya A, Löf M, Park W, Reilly JJ, Sharma D, Tremblay MS, Veldman S. Promoting healthy movement behaviours among children during the COVID-19 pandemic. Lancet Child Adolesc Health 2020. Published online April 29, 2020.

Instituto Datafolha. Comportamento da população – Coronavírus, Março de 2020.

Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletins Epidemiológicos. Doenças pelo coronavírus 2019 (COVID-19). Semanas Epidemiológicas 15 e 16.

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